terça-feira, 29 de março de 2011

Dazed and Confused

O imaginário humano não tem limites. Tanto o antigo quanto o atual. O universo Tolkeniano é tão ou mais rico que a mitologia grega. Batalhas épicas, criaturas fantásticas e histórias que refletem os conflitos humanos. Esse tipo de história ficou muito popular nas décadas de 70, 80 e 90. Começou com Tolkien e C.S. Lewis, e depois vieram muitos outros seguindo o mesmo gênero. Geralmente o mundo onde a história se ambienta é um mundo medieval, com cavaleiros em armaduras brilhantes, donzelas a serem salvas e tarefas quase impossíveis cumpridas pelos heróis mais improváveis. Realmente, dúzias desse tipo de obras (com suas próprias variações que as tornam únicas, como, por exemplo, o steampunk) apareceram por aí nos últimos anos. Transformadas em filmes, jogos de tabuleiro e videogames, essas obras são especiais e muito diferenciadas, mas olhando a grosso modo, são o mesmo gênero. E para todo status quo, há alguém que o contesta e que nada contra a corrente.

Bom, quando os livros de fantasia são o status quo, surge seu maior ridicularizador: Terry Pratchett.

Terry Pratchett é um inglês que, farto das obras de fantasia, decide criar sua própria. Porém ela é totalmente satírica, carregado de críticas sociais e o melhor do... Incomum humor inglês.

Ele publica então "A Cor da Magia", um livro sobre um mago fracassado que é obcecado pela idéia de que, na sua morte, o próprio Morte terá que vir buscá-lo. Estranho? Essa história se passa no mundo de Discworld, um mundo plano carregado por quatro elefantes gigantescos em cima do casco de uma tartaruga mais gigantesca nadando por um oceano ainda mais gigantesco (Na verdade Pratchett pegou essa idéia emprestada da mitologia hindu). Mais estranho?

Discworld é regido por um sem-número de deuses jogando xadrez com outros deuses, onde as peças são os seres humanos. Esses deuses comandam criaturas míticas como o Morte (sim, no masculino mesmo) e brincam com a vida dos homens. Esse primeiro livro da série Discworld fala sobre Rincewind, um mago reprovado na escola de magia e vive de truques baratos para sobreviver na corrupta Ankh-Morpork, uma crítica social das mais pesadas. Em Ankh-Morpork, por exemplo, existem guildas regulamentadas como a dos ladrões e a dos assassinos, que tem representantes no governo, e um sistema social estranhamente parecido com o capitalista selvagem... A vida de Rincewind muda quando uma oportunidade surge: um turista vindo de uma terra riquíssima chega à Ankh-Morpork, querendo conhecer as sutilezas de uma terra tão bárbara, por um acaso Rincewind acaba sendo seu guia. As situações que os dois vão encontrar são engraçadíssimas, até porque enquanto o turista DuasFlor (sério, esse é o nome dele), um completo idiota, acha tudo muito divertido e inclusive paga pela diversão de ser assaltado, participar de uma briga de bar e ser raptado por dragões, Rincewind é um covarde do mais alto nível.

Apesar de maravilhoso, o livro pode parecer confuso para aqueles não-familiarizados com as obras de fantasia mais tradicionais, como "O Senhor dos Anéis" e "Crônicas de Nárnia" entre outros. Mas é impossível não se divertir com as aventuras de uma dupla tão inusitada.

Mas talvez o seu melhor livro não seja tão satírico assim. No começo, Discworld era para ser apenas uma brincadeira, uma paródia com as obras de fantasia que faziam tanto sucesso no final dos anos 80. Mas Terry Pratchett conquistou o público, e Discworld virou uma série com sua própria mitologia, exatamente como a de Tolkien. Sem nunca deixar de lado a sátira e o humor inglês, Pratchett foi se aprofundando. Uma das suas últimas obras é discutivelmente a melhor: "O Fabuloso Maurício e seus Roedores Letrados".

A história varia mais para o suspense do que para a comédia. Maurício é um gato, que por meio de um... Acidente adquire intelecto humano. Mas ele não é o único. Ele encontra um grupo de ratos também com inteligência humana. Esses ratos se submetem ao seu comando, bem como um flautista ingênuo, e assim Maurício e seus roedores letrados passam de cidade em cidade prometendo curar a epidemia de ratos ali presente. O flautista toca algumas notas, e centenas de ratos imediatamente saem de seus esconderijos e seguem o flautista para fora da cidade. A verdade é que os ratos com mais inteligência convencem os ratos comuns a infestar a cidade, bem como os convencem a sair quando ouvirem uma flauta... Assim Maurício enriquece. A história por si já é interessante, pois os ratos com inteligência humana também tem características humanas... Eles se sentem solitários, amorosos, rancorosos, tem ambição, ganância e inclusive uma religião! Mas Maurício os mantém (e ao flautista) controlados com mentiras, mas alguns ratos são mais difíceis de convencer do que outros...

Os cinco primeiros ratos inteligentes, e os seguidores de Maurício, são: Perigoso Feijão, um ratinho frágil mas muito inteligente, sempre envolvido com questões existenciais das mais profundas. Pêssego, uma rata com uma capacidade de argumentação e liderança de rivalizar com os maiores oradores e políticos. Bronzeado Intenso, um rato durão, chefe do Esquadrão Anti-Ratoeiras e especialista em desarmá-las. Sardinhas, um rato dançarino e brincalhão, que encara tudo com diversão. E por último o chefe, Fiambre Suíno, o mais velho dos ratos, e o mais teimoso.

A história começa quando eles decidem fazer seu último trabalho na cidade de Panqueca Estragada. Mas coisas estranhas estão acontecendo na cidade. Há uma epidemia de ratos real, e dois caçadores de ratos contratados mexeram com poderes mais antigos e mais poderosos do que imaginam para lidar com ela...

O livro é muito divertido por mexer com o surreal e também com características humanas refletidas nos ratos. A história toma rumos muito macabros com o passar do tempo, e o jogo que Pratchett faz com os capítulos, intercalando as histórias dos ratos com a de Maurício e do flautista é digno do mestre que ele é.

Pratchett é um escritor muito engraçado e relaxante de se ler, com uma leitura mais leve e que flui mais facilmente... E ainda assim com um toque de suspense na medida certa. Vale à pena conhecer. O humor ácido de Pratchett o deixará tonto e confuso.


 


 


 

"Been dazed and confused for so long (…)"

Dazed and Confused

Led Zeppelin

Led Zeppelin I

Atlantic Records


 

2 comentários:

  1. Vi, adorei essa resenha. Quero ler esse cara!!!!

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  2. Detalhe: eu olhei nas livrarias e tem uma tonelada de livros desse cara. Eu gostei da última história q vc resenhou (Maurício). Vc acha q esse é um bom livro para começar?

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