Deitado sobre a relva, o garoto assistia as estrelas. Eram
uma imensidão, tantas que contar era irrelevante, mas ele fazia isso mesmo
assim, e se maravilhava sempre que uma riscava o céu iluminado, fazendo-o
perder a conta e permitindo que começasse tudo de novo. Estava sozinho, embora
desejasse não estar, mas isso não importava agora. O que importava eram as
estrelas e seu jogo de brilhar, piscar e cair. Ele se perguntava por que os
adultos se preocupavam tanto durante suas vidas se havia um céu estrelado daquele
jeito esperando por eles à noite. Não haviam filas, números ou ingressos: o
show de estrelas estava aberto a todos, começava quando queria, terminava
quando bem entendia, e deixava o garoto maravilhado durante todo o espetáculo.
Durante o dia, o garoto se esforçava ao máximo para
convencer os adultos ao seu redor a se juntar a ele em observar as estrelas,
mas eles nunca prestavam atenção. Sempre precisavam dormir cedo, pois estavam
cansados por ter de trabalhar o dia todo e precisavam acordar cedo para
trabalhar de novo. O garoto não entendia, mas não dizia nada. Então ele tentava
descrever as estrelas e sua imensidão, mas não podia, acabando pedindo
novamente que o acompanhassem e era novamente ignorado.
Por isso ele pensava, contemplando tudo aquilo, sentido a
grama nas suas costas, o vento frio da madrugada no seu rosto, que tudo o que
ele queria era compartilhar tudo aquilo com alguém. Queria que os adultos
vissem o que ele via, mas não exatamente o que ele via: Queria que eles
tivessem suas próprias visões, que gostassem ou desgostassem, mas sobretudo que
vissem. Não havia nada mais importante.
Queria discutir com elas se aquela constelação realmente
parecia um caçador; se aquela outra não era igualzinha a um cavalo, ou um homem
metade cavalo; se aquelas estrelas não estavam perfeitamente alinhadas, ou se
essa brilhava mais intensamente do que as outras. E os adultos concordariam, ou
discordariam, ou discutiriam com outros adultos, e todos aproveitariam o
espetáculo. Mas ao invés disso, ele estava sozinho, e felizmente as estrelas
não pareciam se importar com o tamanho da plateia, se apresentando mesmo assim.
E esse pensamento angustiava o garoto: como fazer com que os
adultos se importassem com as estrelas? Era uma angústia que atrapalhava o
espetáculo, e o garoto desejava que ela não existisse, mas não podia afastá-la
completamente de seus pensamentos. Se ao menos eles compreendessem...
Então, no dia seguinte, o garoto levou um caderno e um lápis
para o show das estrelas, esperando que elas não se importassem, e começou a
escrever o que via. Escreveu sobre a imensidão delas, escreveu sobre como eram
impossivelmente belas, sobre seu brilho distante, sobre como algumas delas, se
juntas com outras, formavam imagens. E escreveu sobre as imagens, e as histórias
que elas contavam, e que histórias elas poderiam contar, se apenas mais pessoas
as vissem. Escreveu até que o show terminasse, e então mostrou o que escrevera
a todos os adultos que pôde encontrar.
Muitos o ignoraram como sempre fizeram, e continuaram
imersos em suas preocupações.
Outros agradeciam,
assentiam, e devolviam o caderno sem sequer ler o que havia nele.
Mas alguns... Alguns leram o que aquelas palavras diziam, e
fitaram o papel longamente, lendo e relendo... Eles pareciam ponderar, sacudiam
a cabeça subitamente, mas não tiravam os olhos das palavras; Em seguida, esses
poucos adultos olhariam fundo nos olhos do garoto, como se procurassem alguma
coisa, e o garoto simplesmente olhava de volta, pois não havia mais nada a ser
feito.
Esses adultos então se enfureceriam; gritavam, se afastavam,
reclamavam do tempo perdido. Mas havia alguma coisa nessa raiva que era
diferente, percebeu o garoto. Então ele continuou mostrando seu caderno para
quem quisesse ver, e no fim do dia, foi observar o espetáculo novamente.
Ele estava sozinho, como sempre. Deitou-se na grama, como
sempre, e esperou que as estrelas começassem sua dança. E a medida que elas se
mostravam, devagar, mas graciosamente, o garoto percebeu que havia alguém ao
seu lado. Não um, mas vários: todas as pessoas que foram cativadas pelo caderno
estavam ali, apesar de sua raiva. Elas olhavam para o alto, tão maravilhadas
quanto o garoto quis que elas estivessem. Elas soltavam exclamações, apontavam,
cutucavam umas às outras e contemplavam tudo aquilo que o garoto sempre quis
mostrá-las. Nenhum dos adultos ali saberia dizer porque veio, mas sabiam que
era lindo, e se perguntavam silenciosamente por que não haviam feito isso
antes.
E ao garoto, elas não disseram nada, pois não havia mais
nada a ser dito.